Uma das maiores redes de moda popular do país nasceu em um imóvel de 60 m² no Brás, zona leste de São Paulo, em 1992. Fruto do empreendimento de quatro irmãos descendentes de espanhóis, a Torra Torra —hoje rebatizada apenas para Torra— expandiu-se para 17 estados do país e atingiu faturamento de R$ 2,3 bilhões em 2024. Nesta sexta-feira (28) de Black Friday, inaugura a sua 90ª loja, na avenida Paulista.
A aposta é que o espaço de 600 m² atraia um público mais diversificado que o das mulheres da classe C, alvo da varejista, especializada em moda feminina, masculina, infantil e cama, mesa e banho. Foram investidos R$ 8 milhões no ponto de venda, que funciona junto à sede da companhia.
“A [loja da] Paulista é o nosso bibelô”, afirma Márcio Ruiz, 50, sócio e um dos fundadores da Torra, responsável pela área comercial. “A região atrai um público muito plural: tem turista, executivo, estudante, pessoal que trabalha em hospital, gente que passeia lá no fim de semana. É uma grande oportunidade de mostrar a nossa marca”, diz ele, que comanda a rede ao lado dos irmãos Mauro e Marcos Ruiz.
O mais velho, Maurício, não é mais sócio da empresa, embora continue “muito envolvido”, segundo Márcio. “Nós quatro nos damos muito bem, nossas decisões são por consenso, nunca brigamos.”
A companhia trabalha com um grupo de 600 fornecedores, confecções localizadas em especial em Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais, que produzem as roupas desenhadas pelo time de estilistas da varejista. “Nos últimos oito anos, quase 100% do que vendemos foi desenvolvido internamente”, diz Ruiz. Apenas roupas pesadas de inverno costumam vir de fora. Cerca de 20% das vendas são de importados, em especial acessórios.
Em março, a empresa obteve autorização do Banco Central para criar uma SCD (sociedade de crédito direto), ou fintech, com capital inicial de R$ 3 milhões. Com isso, poderá realizar empréstimos e outras operações financeiras para seus clientes, como venda de seguros. “Estamos estudando quais os produtos que serão lançados em 2026”, diz Ruiz.
Hoje a empresa soma 1,5 milhão de clientes ativos no cartão da loja, private label, que responde por mais de um terço (35%) das vendas. De acordo com Ruiz, todo o lucro (não revelado) é reinvestido na expansão da companhia, que planeja fechar o ano com faturamento de R$ 2,5 bilhões.
“A única aquisição foi no Sul, uma rede pequena, Sul Center, de oito lojas. De resto, nosso crescimento sempre foi orgânico”, diz o empresário, que planeja atingir 200 unidades até 2031, mais do que dobrando de tamanho. Também nesta sexta, a Torra abre sua 91ª loja em Mogi das Cruzes (SP). Para 2026, estão previstos outros cinco pontos de venda.
A varejista ultrapassou a Zara em 2024, de acordo com o ranking Top 300 do Varejo Brasileiro, organizado pelo IRTT (Instituto Retail Think Tank). No ano passado, as vendas de 86 lojas Torra somaram R$ 2,297 bilhões. Já a Zara, com 52 lojas (incluindo Zara Home), somou faturamento de R$ 2,271 bilhões.
“Eles [Torra] são bastante competitivos junto à consumidora da classe C, ocupando o espaço que era da Marisa”, diz o consultor Alberto Serrentino, da Varese Retail. “Abriram lojas em vários estados, têm uma agressividade comercial muito forte.”
Apesar do sucesso, a rede soma episódios de acidentes e falhas de infraestrutura nas lojas. O mais trágico ocorreu há 12 anos, às vésperas da inauguração da sua loja na avenida Mateo Bei, em São Mateus, extremo leste de São Paulo. Alterações na infraestrutura do local, com a criação de um novo pavimento e a retirada de colunas de sustentação, levaram ao desabamento da obra, em 27 de agosto de 2013. Dez operários morreram e 26 pessoas ficaram feridas.
A Torra não era dona do imóvel e acusou o proprietário pela reforma malfeita. O proprietário, por sua vez, disse que só fez as alterações na obra a pedido da Torra. Uma indenização de R$ 3,5 milhões foi paga à família das vítimas.
Márcio Ruiz lembra que esse foi o momento mais difícil da história da empresa. “Nosso time entrou apenas para fazer o acabamento, a loja estava pronta, porque esse era o combinado. O prédio desabou vazio, estava sem roupas, estoque, nada. Foi um momento terrível, uma história bastante triste.”
Em 12 de outubro deste ano, um grande incêndio consumiu uma loja na Lapa, zona oeste da capital paulista —ainda não se sabe as causas do acidente. “Suspeita-se de uma tomada, mas a investigação ainda não foi concluída”, afirma Ruiz. Em 14 de fevereiro de 2011, outro incêndio já havia atingido a loja Torra na rua Direita, zona central de São Paulo; as chamas destruíram o imóvel de dois andares. Nos dois casos, ninguém ficou ferido.
Em 16 de outubro do ano passado, o técnico que fazia a manutenção do elevador de uma loja em Porto Alegre morreu após cair no fosso do equipamento, depois que o cabo de aço se rompeu.
“A gente sempre está buscando melhorar [a segurança]”, diz Ruiz. “Temos um olhar redobrado para os cuidados. Mas todas as providências já são tomadas. Infelizmente, acidentes acontecem.”
No varejo brasileiro, a maior parte dos imóveis é alugada. De acordo com Kevin de Sousa, advogado especializado em direito imobiliário, os proprietários são responsáveis pela estrutura predial e eventuais vícios construtivos, enquanto o inquilino deve se responsabilizar pelas manutenções preventivas.




