Sancionada nesta quarta-feira (26) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a isenção do Imposto de Renda (IR) para salários de até R$ 5.000 une a agenda de “justiça social” do governo à sua estratégia de campanha, mas já acende um alerta vermelho no mercado. A preocupação central reside nas implicações fiscais da medida e na sinalização de que o benefício pode ser estendido à Participação nos Lucros e Resultados (PLR), o que exigiria uma compensação ainda maior via novas tributações.
Lula argumenta que é injusto que ele, ao receber dividendos, não pague nada de IR, enquanto um trabalhador que recebe um bônus de R$ 10.000 como participação nos lucros precise pagar o tributo.
No modelo atual, a PLR possui um regime de tributação exclusiva na fonte e uma tabela progressiva própria — mais vantajosa que a incidente sobre os salários —, sendo tributada apenas quando o valor recebido pelo empregado excede R$ 8.214. A proposta de isenção total equipararia o bônus ao salário isento, mas geraria uma renúncia fiscal adicional considerável. O temor do mercado é que a conta dessa equiparação recaia sobre o setor produtivo, possivelmente via aumento da CSLL ou do IRPJ das empresas.
Conta da renúncia e compensação podem aumentar com isenção do IR à PLR
A perda arrecadatória com a isenção do IR é substancial. Projeções indicam uma renúncia fiscal de R$ 31,3 bilhões apenas em 2026, valor que aumenta para R$ 33,5 bilhões em 2027 e R$ 35,9 bilhões em 2028, apontam especialistas.
Para cobrir esse rombo, o governo instituiu novos mecanismos de tributação, com foco na alta renda. A compensação deve assegurar uma receita de R$ 34,1 bilhões em 2026. Os principais mecanismos são a criação do Imposto Mínimo para Altas Rendas e a Taxação de Dividendos ao Exterior. O ministro Fernando Haddad defendeu que o projeto é “neutro do ponto de vista fiscal”, enfatizando que, pela primeira vez, o ajuste das contas foi feito por meio do “andar de cima”.
Apesar da narrativa de justiça social, a nova arquitetura tributária levanta sérias preocupações para o empresariado. A compensação via taxação da alta renda, especialmente sobre lucros e dividendos, é vista como um mecanismo de “dupla tributação”.
A crítica argumenta que dividendos já são tributados indiretamente, pois provêm de lucros após impostos corporativos. O imposto adicional de 10% representa uma dupla tributação que desestimula investimentos. Na prática, ao reduzir o retorno líquido do acionista, a medida torna o mercado de capitais brasileiro menos atrativo, impactando a alocação de capital e afugentando investidores que buscam ambientes de negócios mais favoráveis. A alegação governamental de que dividendos são “livres de impostos” é considerada enganosa e divisiva.
A ampla isenção de IR afasta o Brasil do modelo de bem-estar social escandinavo, onde praticamente toda população ativa contribui proporcionalmente. Enquanto na Noruega (93%) e Dinamarca (90,6%) a maioria paga IR, no Brasil apenas 34 milhões (16%) pagarão a partir de 2026.
Essa redução da base tributária diminui o “letramento fiscal” — contribuintes tendem a cobrar maior eficiência dos gastos públicos. A longo prazo, a menor arrecadação sobre renda pode forçar maior tributação sobre consumo, modelo regressivo que prejudica desproporcionalmente os mais pobres.




