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Ministério pede apuração sobre Rioprevidência e Master – 28/11/2025 – Mercado

O Ministério da Previdência Social identificou operações financeiras consideradas suspeitas envolvendo títulos públicos federais realizadas pelo Rioprevidência (Fundo Único de Previdência Social do Estado do Rio de Janeiro) por fundos administrados pela Master Corretora, vinculada ao grupo controlado por Daniel Vorcaro.

A pasta acionou a Polícia Federal, o Banco Central, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e o TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro) para pedir o aprofundamento das apurações e a identificação de possíveis ilícitos administrativos e penais. Em relatório preliminar sobre o tema, elaborado em 24 de novembro, os técnicos apontam indícios de uso de informação privilegiada em operações.

A concentração de R$ 2,9 bilhões em investimentos do Rioprevidência em instituições ligadas ao Master também é alvo de apuração.

Procurado, o Rioprevidência disse que as afirmações da pasta são “inverídicas e despidas de qualquer fundamento contratual” e que buscará responsabilização dos autores da análise feita pelo ministério.

O Banco Master, que teve a liquidação decretada pelo BC neste mês por graves violações às normas do sistema financeiro nacional, não respondeu aos questionamentos da Folha.

Os técnicos da Previdência identificaram que o valor total da exposição do Rioprevidência ao Master é de R$ 2,9 bilhões, dos quais R$ 970 milhões são letras financeiras emitidas pela instituição.

Outro R$ 1,32 bilhão foi aplicado de janeiro a setembro de 2025 no fundo Arena, que tem o Rioprevidência como único cotista. Ele é gerido pela Arena Capital e administrado pela Master Corretora. Há ainda R$ 641,5 milhões alocados em outros três fundos também administrados pela Master.

TÍTULOS PÚBLICOS

A nota técnica, elaborada pela Coordenação de Acompanhamento de Investimentos da Secretaria de Regime Próprio e Complementar do ministério, chama a atenção para operações de compra e venda de títulos públicos, incluindo papéis de prazo mais longo, em curtos intervalos de tempo. Segundo o documento, a estratégia foi adotada tanto na carteira própria do Rioprevidência quanto nas aplicações por meio do fundo Arena.

Em alguns casos, o fundo de previdência comprava e vendia os mesmos volumes de um papel ao longo de alguns meses, o que tinha impacto financeiro líquido nulo sobre o saldo dos ativos, mas onerava o regime próprio de aposentadoria com a incidência de todos os custos de transação associados, reduzindo a rentabilidade dos investimentos.

Entre dezembro de 2024 e setembro de 2025, por exemplo, o Rioprevidência comprou e vendeu R$ 1,95 bilhão em títulos públicos, “um giro quase integral do portfólio em menos de dez meses, [o que ] é conceitualmente inconsistente com os princípios de uma gestão previdenciária, cujo horizonte de investimento é de longo prazo”, segundo o documento. Para os técnicos do governo, a estratégia “carece de racionalidade econômica”.

Segundo o documento, o desempenho do fundo Arena “foi substancialmente adverso” e registrou um retorno acumulado de 2,03% entre dezembro de 2024 e outubro de 2025, enquanto o CDI acumulou 12,10% no mesmo período. A performance, na visão dos técnicos, é incompatível com o perfil de risco do fundo.

Em nota, o Rioprevidência apresenta outros percentuais de rentabilidade. O órgão afirma que o fundo Arena teve desempenho de 126% do CDI no primeiro semestre e de 70% do CDI no acumulado do ano. A instituição acusa os técnicos do ministério de “falsa comunicação”.

A Arena Capital, que faz a gestão do fundo Arena, afirma que os cotistas não perderam recursos, pois não houve realização de prejuízo. “As oscilações observadas refletem apenas movimentações de mercado de caráter temporário, compatíveis com a natureza dos ativos e com a estratégia adotada pelo fundo.”

A instituição tinha ao todo R$ 1,92 bilhão em ativos sob sua gestão no fim de outubro, de acordo com ranking da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).

A nota do Ministério da Previdência diz que o regulamento do fundo Arena permite a realização de operações com recursos do Rioprevidência tendo a própria Arena Capital ou a Master Corretora como contraparte, ou seja, como compradora ou vendedora de títulos. Para os técnicos do governo, a cláusula por si só já suscita a necessidade de avaliar potencial conflito de interesse.

“Diante da confluência de fatores observados —como a estruturação do fundo exclusivo, a inexperiência do gestor, o desempenho acentuadamente desfavorável, a omissão de informações e os múltiplos indícios de potencial conflito de interesses—, levanta-se a questão sobre a possibilidade de ocorrência de práticas não equitativas de mercado, como o ‘front running'”, afirma o ofício em que o ministério pede as investigações.

O “front running” consiste no uso de informação privilegiada sobre uma operação futura para antecipar alguma transação e conseguir lucrar com esse movimento.

Para exemplificar os indícios dessa prática, o documento cita ainda outra operação com a carteira própria do Rioprevidência, na qual o fundo alienou 30 mil títulos públicos atrelados à inflação a um preço mais baixo do que estaria sendo praticado no mercado naquele momento. Apenas um minuto depois, o mesmo volume foi vendido por um valor unitário 4,6% mais alto.

“Desse modo, a contraparte que adquiriu os títulos do Rioprevidência às 9h31 poderia, teoricamente, liquidar a posição no mercado às 9h32, realizando um ganho superior a R$ 520 mil com risco praticamente nulo e em poucos segundos”, afirma a nota.

Para a Previdência, o caso poderia corresponder a uma transferência do patrimônio dos segurados para uma contraparte, que se beneficiaria da compra do ativo por um preço artificialmente descontado, “viabilizada pela execução da venda do RPPS em condições desfavoráveis”.

A Arena Capital nega, em nota, qualquer prática de “front running” por parte da instituição, de seu gestor ou de qualquer prestador de serviços vinculado ao fundo. A instituição diz seguir as regras estipuladas pelos órgãos competentes.

O Rioprevidência afirma que o fundo Arena não investiu em ativos do Master, empresas coligadas ou instrumentos de crédito privado. A carteira, segundo a entidade, é exclusivamente composta por títulos públicos federais.

O órgão ligado à Previdência do Rio ainda criticou, em letras maiúsculas, o fato de o ministério manter o Master entre as instituições elegíveis para administrar e gerir fundos de investimento. A corretora foi incluída pelo BC entre as instituições a serem liquidadas pela autarquia.

“Chama atenção não apenas o fato que, mesmo após a liquidação, não atualizaram a lista exaustiva e a Corretora Master segue nela (!!!) e [também chama atenção] a omissão criminosa que foi o MPS e sua equipe, e não a Rio Previdência ou qualquer RPPS, que habilitaram e mantiveram a Corretora Master na lista”, diz.

O Rioprevidência afirma que vai solicitar acesso ao relatório para apurar por qual razão o ministério e a coordenação que elaborou o documento “jamais nos alertaram [sobre eventuais restrições do Master] ou procederam a retirada da Lista Exaustiva por eles publicada”.

A relação entre o Rioprevidência e o Banco Master também é avaliada pelo TCE-RJ, que em outubro indicou que o instituto de previdência ignorou alertas da corte e continuou a aplicar recursos em investimentos associados ao conglomerado financeiro. O tribunal determinou que o Rioprevidência interrompesse os aportes.

No último dia 18, o BC decretou a liquidação do Banco Master. Daniel Vorcaro, dono da instituição, foi preso pela Polícia Federal na noite anterior, em São Paulo, enquanto tentava embarcar para fora do país.

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