A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) a favor do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e contra a revisão da vida toda coloca um fim na possibilidade de correção de benefícios prejudicados pela reforma da Previdência de 1999, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
Por 8 votos a 3, o Supremo derrubou a correção, em julgamento no plenário virtual da corte que se encerrou na madrugada de quarta-feira (26). Advogados previdenciaristas apontam que é preciso esperar a publicação da decisão pelo STF para que os processos parados na Justiça voltem a andar e seja aplicado o entendimento que cabe a cada ação.
Além disso, há ainda o andamento de outro processo que também trata sobre o tema, a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 2.110, cujo pedido de vista —mais tempo para analisar o caso— suspendeu o julgamento no plenário virtual da corte na segunda-feira (24).
A revisão da vida toda é uma ação judicial na qual os aposentados do INSS pedem para que sejam incluídas na conta da aposentadoria contribuições feitas em outras moedas, antes do Plano Real. Por 8 votos a 3, o STF derrubou a revisão em julgamento no plenário virtual.
Pela decisão, segurados que tiveram a aposentadoria aumentada após conseguir a revisão por meio de tutela antecipada não vão precisar devolver o valor que receberam. O INSS pode, no entanto, reduzir o valor do benefício.
Os beneficiários também não terão de pagar custas processuais, honorários de sucumbência ao governo nem valores de perícias judiciais até 5 de abril de 2024, data em que foi publicada a ata do julgamento que derrubou a correção há dois anos.
A advogada Adriane Bramante, conselheira da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil em SP) e do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), afirma que a revisão da vida toda já não existe mais após as recentes movimentações do Supremo.
Segundo ela, os efeitos práticos da decisão não serão automáticos e não atingem todos os processos da mesma forma. Apenas aposentadorias que tiveram tutela antecipada podem sofrer a redução imediata do valor, diz, mas cada ação dependerá da fase processual, do juiz responsável e das circunstâncias específicas do caso.
Para ela, é preciso deixar claro a aposentados que não é mais possível fazer o pedido. “É muito complicado, tem muita esperança ainda e muita fakenews. Continuar com discussão no Supremo não vai fazer muita diferença. Eles [ministros do STF] não vão julgar efetivamente a tese da revisão da vida toda, vão decidir apenas para trazer a questão dos efeitos financeiros, mas não para redefinir o mérito”, diz.
Sobre o pedido de vista apresentado no julgamento, ela ressalta que, embora atrase o resultado, trata-se de um direito do ministro Dias Toffoli, que fez a solicitação, e não deve alterar o final.
Para o advogado João Badari, do escritório Aith, Badari e Luchin, ainda há pontos relevantes em aberto, que precisam ser esclarecidos, como o que acontece com quem já possui decisão com trânsito em julgado, ou seja, sem possibilidade de recurso.
Badari afirma que ainda podem ser apresentados embargos de declaração no processo no STF. Para ele, a principal problema diz respeito ao fato de que o INSS pode rescindir decisões já definitivas caso o Supremo mantenha entendimento contrário ao que beneficiou o segurado.
Nesses casos, segundo o advogado, o INSS teria de ajuizar ação rescisória para diminuir o valor do benefício.
Para o advogado, permitir que decisões definitivas sejam desfeitas após mudança de entendimento do Supremo sobre uma tese compromete a segurança jurídica. “Não seria justo fazer um aposentado, que já tinha seu direito assegurado por sentença definitiva, voltar ao benefício anterior”, afirma.
Murilo Aith, do mesmo escritório, destaca o papel dos embargos de declaração para corrigir algum tipo de omissão, contradição ou decisão obscura em um voto, mas também entende que não há mais nada que possa alterar o mérito da decisão.
No tema 1.102, que discute a revisão da vida toda, ele lembra que ministro Kassio Nunes Marques apresentou voto para transformar os embargos de declaração do INSS em infringentes. A intenção era “enterrar” a correção, após julgamento do STF de 2024, quando os ministros derrubaram a tese, que tinha sido aprovada em 2022.
“Embora o direito à revisão tenha sido reconhecido pelo STF em 1º de dezembro de 2022, decisões posteriores — especialmente nos julgamentos das ADIs 2110 e 2111 — afirmaram a constitucionalidade do artigo 3º da lei previdenciária, que impede o segurado de escolher a regra mais favorável”, diz.
Entenda o vaivém da revisão da vida toda no STF
A revisão da vida toda chegou a ser aprovada pelos ministros em dezembro de 2022, por 6 votos a 5. Em março de 2024, a tese que tratava da possibilidade de correção foi derrubada em nova votação, desta vez em duas ADIs (Ações Direta de Inconstitucionalidade), que tratavam sobre o fator previdenciário e a reforma da Previdência de 1999.
Isso porque a tese da correção questiona justamente o cálculo das aposentadorias imposto pela reforma do governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso. O direito é discutido porque, nesta mudança, novos segurados do INSS tiveram regra melhor para a aposentadoria do que quem já estava no mercado de trabalho.
Pela lei, quem era segurado do INSS filiado até 26 de novembro de 1999 tem a média salarial calculada com as 80% das maiores contribuições feitas a partir de julho de 1994.
Mas quem passou a contribuir com o INSS a partir de 27 de novembro de 1999 e atingiu as condições de se aposentar até 12 de novembro de 2019 tem a média calculada sobre os 80% maiores salários de toda sua vida laboral.
A reforma de 2019 mudou isso. Quem atinge as condições de se aposentar a partir do dia 13 de novembro de 2019 tem a média salarial calculada com todas as contribuições feitas a partir de julho de 1994. A correção, no entanto, seria limitada. Em geral, compensando para quem tinha altos salários antes do início do Plano Real.





