terça-feira, dezembro 2, 2025

Transação tributária em São Paulo: oportunidade ou parcelamento? – 02/12/2025 – Que imposto é esse

A PGE-SP (Procuradoria Geral do Estado de São Paulo) publicou, recentemente, o Edital nº 01/2025, inaugurando nova rodada de transação tributária por adesão, que pode ser feita até 27 de fevereiro de 2026, para contribuintes com débitos de ICMS, ITCMD, IPVA e multas do PROCON inscritos em dívida ativa. A medida, amparada pela Lei nº 17.843/2023, tem como objetivo ampliar a regularização fiscal e reduzir o contencioso, mas levanta questionamentos relevantes quanto à sua real atratividade.

O modelo oferece algumas condições especiais que, à primeira vista, parecem vantajosas. Permite o parcelamento em até 120 meses, admite a utilização de créditos acumulados de ICMS ou de precatórios estaduais para compensação de até 75% do valor devido e prevê descontos de até 75% sobre multas e juros, limitados a 65% do total consolidado da dívida.

Além disso, concede ao contribuinte a possibilidade de selecionar quais débitos incluir, sem a exigência de adesão integral, o que permite excluir discussões judiciais ou administrativas em que se vislumbre bom prognóstico de êxito. Contudo, esse ponto deve ser avaliado com cautela pelos contribuintes, haja vista que a adesão implica renúncia expressa a processos administrativos e judiciais relacionados aos débitos transacionados, com desistência de impugnações, recursos e ações em curso.

Apesar de prever a regularização de R$ 15 bilhões em dívidas, o edital adota sensível sistemática de classificação da recuperabilidade dos créditos tributários. De acordo com a Resolução PGE nº 6/2024, recentemente alterada pela Resolução nº 53/2025, os débitos são enquadrados como irrecuperáveis, de difícil recuperação ou recuperáveis, a partir de critérios estabelecidos pela PGE. Apenas os contribuintes classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação podem usufruir de reduções sobre multas e juros.

Em razão da metodologia de classificação, a ampla maioria das empresas tende a se enquadrar na categoria de crédito recuperável, o que as exclui do principal benefício da transação. Nem mesmo os honorários de sucumbência, em tais casos, podem ser reduzidos, reforçando a percepção de que a medida se aproxima de um parcelamento incentivado, o que foge da ideia de política pública inaugurada pela Lei nº 13.988/23, que regulamentou a transação tributária em âmbito Federal e tem tido ótimos resultados.

O problema não é novo. Historicamente, a metodologia utilizada para aferição da recuperabilidade do crédito em São Paulo resulta em que a grande maioria dos créditos sejam classificados como recuperáveis e, portanto, não sujeitos a descontos. A restrição não decorre do edital recentemente publicado, mas da metologia descrita na Resolução PGE nº 06/2024, que determina os critérios para aferição do grau de recuperabilidade das dívidas. A fórmula de pontuação resume a aferição da recuperabilidade do crédito à soma de garantias, parcelamentos, histórico de pagamentos e idade da dívida (NF = G + P + H + I). Contudo, desconsidera fatores cruciais para uma análise realista da capacidade de pagamento dos contribuintes e, consequentemente, da recuperabilidade do crédito tributário. Elementos como o passivo total da empresa, o nível de endividamento perante o próprio Estado e outros entes federativos, bem como indicadores econômico-financeiros de solvência e liquidez, são completamente ignorados. O resultado é uma classificação que tende a enquadrar como créditos recuperáveis as dívidas de contribuintes que carreguem elevados passivos e dificuldades financeiras concretas. Em vez de aferir efetivamente a chance de recuperação dos créditos, a fórmula privilegia critérios formais, deixando de lado a avaliação material da situação econômico-empresarial, o que compromete a racionalidade e a efetividade da política de transação tributária.

Essa condição pode ser um limitador do impacto do programa de transação do Estado de São Paulo, haja vista que o resultado prático pode ser frustrante para empresas em crise (não sujeitas a recuperação judicial ou falência), com passivos relevantes e com desejo de regularização.

A experiência paulista evidencia que, embora a transação tributária represente avanço institucional, sua eficácia depende de calibragem fina. Ao utilizar a sua metodologia restritiva, o Estado acaba por afastar grande parte do universo de contribuintes que poderiam enxergar no instituto uma oportunidade de encerrar litígios e recompor o equilíbrio fiscal. Em vez disso, cria-se a sensação de que se trata apenas de mais um programa de parcelamento, com roupagem jurídica distinta.

Para que a transação tributária se consolide em São Paulo como um verdadeiro instrumento de política fiscal e de redução do contencioso, é necessário repensar a legislação que sustenta sua aplicação e os critérios de aferição do grau de recuperabilidade do crédito. Até lá, caberá às empresas avaliar caso a caso, a conveniência da adesão, ponderando, majoritariamente, o alongamento de prazos, o uso de créditos ou precatórios e os riscos de renunciar a processos administrativos e judiciais em curso.

Se o Estado avançar na direção de um modelo mais equilibrado, com parâmetros que levem em conta a real capacidade de pagamento das empresas, poderá ampliar a base de adesão e, por consequência, aumentar a arrecadação e reduzir a litigiosidade. Além disso, a política poderá contribuir efetivamente para a manutenção de empresas, preservando empregos e fortalecendo a economia local.


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