terça-feira, dezembro 2, 2025

Café especial: pequenos produtores investem em torrefação – 02/12/2025 – Mercado

A produtora rural Ilma Rosa Correia Franco, 69, resolveu fazer um teste com parte do café especial colhido na propriedade da família, em Campestre (MG), e passou a cuidar de todo o processo envolvendo a cafeicultura, do plantio até a chegada à xícara dos consumidores. Resultado: aumentou em 50% a receita obtida por saca, e hoje o café com sua marca chega a compradores de todo o país.

A “descoberta” por pequenos produtores de que o preço da saca de cafés especiais pode render uma renda extra em comparação com o grão convencional e a forte valorização que a cultura teve nos últimos anos motivou cafeicultores a investirem em torrefações próprias ou em parcerias no interior de Minas Gerais.

Situada na região vulcânica, que compreende partes do sul de Minas Gerais e da Mogiana paulista, a propriedade da família com cerca de 30 hectares dedicados aos cafés finos tornou-se local de secagem, descanso, beneficiamento, rebeneficiamento e torra, até chegar à marca Rosa Franco.

“Eu mesma que preparo, com o padrão de cada café. Porque cada café, mesmo sendo na mesma terra, dá para sentir um sinal diferente, tanta variedade. Então eu preparo pro meu torrador de amostra pra ver qual que é a curva de torra ideal para cada um”, disse.

Por enquanto, o total destinado à fabricação própria do rótulo é pequena, dez sacas, mas o suficiente para mostrar o quão lucrativa a iniciativa é em comparação com a venda do café verde. Ilma levou sua marca à SIC (Semana Internacional do Café), em Belo Horizonte, e vendeu o pacote de 500 gramas a R$ 50, o que significa R$ 100 o quilo.

A saca de café verde com 60 quilos é vendida por ela a R$ 3.300. Com essa mesma saca, quando torrados são aproveitados 50 quilos, segundo a produtora, o suficiente para render cerca de R$ 5.000.

“Na torra, vendendo as nossas torras, a gente ganha mais em valor. A procura era muito grande pelos meus cafés, porque todo mundo procurava, o que foi incentivando a torrar.”

Dados do Sebrae Minas apontam que o estado tinha em outubro 863 empresas de torrefação e moagem de café, das quais 728 microempresas. Desse total, cerca de 50 foram abertas entre janeiro e agosto deste ano, 48% mais que no mesmo período do ano anterior.

Outra região mineira de destaque no setor é a Mantiqueira de Minas, com cerca de 8.000 produtores em municípios como Carmo de Minas, São Gonçalo do Sapucaí e Santa Rita do Sapucaí, e que tem propriedades com altitudes superiores a mil metros, solo favorável e clima ameno, características que contribuem para um terroir próprio.

Em geral, é um café com notas florais, cítricas e frutadas, com corpo cremoso, toques de caramelo e chocolate e finalização longa.

Em São Gonçalo do Sapucaí, o produtor Willer Arantes fez uma parceria com uma micro torrefação para lançar sua marca própria, Aroma da Serra, produzida numa área de 45 hectares destinados ao café na propriedade que tem 1.200 m de altitude.

A produção anual é de cerca de mil sacas por safra e, por enquanto, só microlotes especiais (com ao menos 84 pontos) são destinados à torra. No caso dele, 15 sacas por safra, comercializadas em pacotes de 500 gramas.

A dificuldade para micro torrefações como as de Ilma e Willer é a distribuição em larga escala, razão pela qual optam por destinar à prática apenas parte de suas produções.

“A gente continua vendendo os cafés verdes, alguns cafés até são exportados. Mas a gente resolveu criar a marca Aroma da Serra para mostrar nosso café principalmente para o público da cidade e do entorno. O pessoal da cidade não tem nem ideia de que o produto vai para tantos lugares. Tem muito gringo que vai lá visitar e eles não tem ideia”, disse. Cada pacote custa R$ 60.

Com as perdas do processo de produção, cada saca rende R$ 6.000 ao produtor, valor que cai para R$ 5.000 com os custos envolvidos.

“No final das contas, o valor do torrado acaba saindo bem mais alto. A saca normal custa cerca de R$ 2.300, o especial chega entre R$ 2.800 e R$ 3.000.”

Ivan Figueiredo, analista do Sebrae Minas na regional sul, disse que os produtores envolvidos com torrefações próprias têm conseguido dar a esses cafés nuances específicas.

“O cuidado que ele tem no campo está levando para a torrefação. E, de certa forma, está atuando diretamente com o consumidor final, que tem valorizado muito os cafés especiais, de qualidade, e os de origem, com sabores especiais. Com isso, o produtor pode, na torrefação, ao torrar e moer seu café já para o consumidor final, ou nas cafeterias e nos empórios, pode se dedicar a ter um café mais especial ainda, dando o seu tom, deixando-o mais específico com aquilo que ele realmente quer levar para o consumidor.”

A intensificação desse fenômeno aparece também em um levantamento da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café), que mostra que 82% das indústrias do setor são nano (até 5 sacas/mês), micro (6 a 50 sacas/mês) ou pequenas (51 a 1.000 sacas/mês).

Celírio Inácio da Silva, diretor-executivo da Abic, disse que o café passou por mudanças muito grandes na última década, quando algumas regiões começaram a ter destaque de acordo com o seu terroir.

“Um café especial tem que trazer rastreabilidade, sustentabilidade, ter notas sensoriais que correspondem àquela matéria-prima. Esses pequenos produtores têm pouca produção, sabem que mesmo que tenham 10 hectares, vai dar 1 hectare ou 1,5 hectare daquele café fantástico. E eles querem ter o orgulho de dizer que eles produziram e levam para aquele café a história inteira dele, como é feito, a família, porque eles estão lá”, disse.

Na avaliação do executivo, o consumidor “demonstrou claramente” que quer uma história. “Quando você coloca o consumidor que está procurando e o produtor que está oferecendo, um pequeno industrial, você começa a ter esse movimento todo que se tem.”

A SIC reuniu 27 mil pessoas de 33 países e gerou cerca de R$ 150 milhões em negócios.

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