segunda-feira, dezembro 1, 2025

Democracia é valor secundário para parte da elite política – 30/11/2025 – Lara Mesquita


A recente condenação e prisão de um ex-presidente e de militares de alta patente por planejarem e tentarem derrubar o regime democrático brasileiro deveria revigorar nossas esperanças na resiliência da democracia.

Ainda assim, esse tipo de evidência judicial e institucional precisa ser interpretado com cautela, pois pesquisas mostram que eleitores podem relativizar princípios democráticos quando outros valores pesam mais.

Pesquisas de opinião reforçam essa impressão. Levantamento do Datafolha realizado a pedido da OAB mostra que 74% dos entrevistados afirmaram que a democracia é sempre melhor que qualquer forma de governo, sugerindo um consenso normativo em torno da democracia.

Estudo do INCT ReDem, da Universidade Federal do Paraná, publicado em maio, aponta que, apesar do imenso apoio à democracia, apenas 38% dos brasileiros se diziam satisfeitos ou muito satisfeitos com seu funcionamento.

Há, portanto, uma dissociação entre apoio abstrato ao regime e avaliação concreta de seu desempenho.

O professor de Yale Milan Svolik e coautores, em artigo publicado no Journal of Democracy, realizaram experimentos em sete países europeus para testar a disposição dos cidadãos em punir políticos que minam a democracia.

Encontraram que eleitores de direita e eleitores pouco interessados em política aceitam votar em candidatos que violam princípios democráticos quando possuem outras prioridades políticas, como temas ligados à imigração ou à preservação da família tradicional.

Parte da elite política brasileira, especialmente aquela que pressiona pela anistia de Jair Bolsonaro e seus aliados, parece ter identificado posição semelhante nos eleitores brasileiros.

Só assim, por exemplo, podemos entender por que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), defende de forma tão enfática a concessão de anistia ao ex-presidente.

Tarcísio parece acreditar que essa posição não resultará em perda de votos em 2026, pois avalia que seu eleitorado atribui valores ao atual governo que ferem mais seus interesses do que a restrição de liberdades civis que resultaria de um rompimento democrático.

Racionalidade semelhante orienta setores da elite política de oposição ao governo Lula, ainda que não necessariamente bolsonaristas.

Para esse grupo, a defesa de valores que falam aos seus eleitores pode mitigar críticas a outras ações, inclusive práticas fisiologistas e de interesse próprio, como evidenciado na expressiva votação da PEC da blindagem na Câmara dos Deputados.

A questão que fica é qual será a capacidade da democracia brasileira de seguir resiliente a ataques no médio e longo prazo.

O apoio declarado à democracia não impede que, diante de conflitos de valores ou interesses, cidadãos e líderes políticos deixem de sancionar comportamentos antidemocráticos, o que representa um risco real para o futuro da democracia.

A resiliência institucional depende não apenas de decisões judiciais e regras formais, mas também da disposição de eleitores e elites de priorizarem a integridade democrática.

E, diante desse quadro, a pergunta inevitável é: estaremos preparados para defender a democracia quando o próximo teste chegar?


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