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Fundador da Dignitas morre aos 92 de suicídio assistido – 01/12/2025 – Equilíbrio e Saúde

Ludwig A. Minelli, fundador da Dignitas, uma das mais conhecidas associações de suicídio assistido do mundo, morreu no último sábado (29). O advogado e ativista, segundo a entidade suíça, fez uso do próprio serviço que criou em 1998. Minelli se matou prestes a completar 93 anos.

No ano passado, o poeta e compositor Antonio Cicero cometeu suicídio auxiliado pela Dignitas. O integrante da Academia Brasileira de Letras tinha Alzheimer, deixou uma carta explicando sua decisão e suscitou um debate até então pouco enfrentado no país.

Nota emitida por seu escritório não informa se Minelli sofria de alguma doença terminal ou sofrimento físico. Pouco afeito a entrevistas, declarou ao Financial Times em 2023 que nunca havia desejado a morte, mas que queria morrer como a avó paterna.

“Ela estava no jardim, olhando para as flores, quando caiu morta. Sem dor, sem medo, apenas vida e depois morte.” A comparação com a avó materna, que, com doença terminal, pediu em vão para um médico algo que lhe encerrasse a dor, foi o primeiro contato de Minelli com o dilema que mais tarde transformou em causa ou, para os críticos, negócio.

Balanço da associação sem fins lucrativos com números de 2024, os mais recentes, mostra que a Dignitas tem 14.996 sócios, incluindo na conta o braço alemão da entidade. Há uma anuidade mínima de 80 francos suíços (R$ 522) e uma taxa básica de 2.500 francos (R$ 16.547) para o suicídio assistido, que não engloba custos médicos e legais.

A operação toda, da viagem ao crematório, chegaria a 10.000 francos (R$ 66.188).

Cicero foi uma das 280 pessoas que a organização ajudou a dar fim na própria vida no ano passado, dentro da média histórica, inferior a 3% do total de associados. A maioria é de estrangeiros vindos de países que não permitem o suicídio assistido —em que o ato é provocado pelo paciente. A lei suíça não permite a eutanásia, que é realizada pelo médico.

Nascido em 5 de dezembro de 1932, Minelli começou a carreira profissional como jornalista nos anos 1950. Correspondente no próprio país da revista alemã “Der Spiegel” e fascinado pela discussão jurídica em torno de direitos humanos na Europa, começou a estudar direito em 1977, com quase 45 anos, quando também fundou sua primeira ONG.

Aos 54 anos obteve a licença para advogar. Especializou-se na proteção de direitos fundamentais e foi um dos primeiros a invocar a realização de plebiscitos, previstos na Constituição suíça mas pouco utilizados, como forma de participação popular, hoje uma prática recorrente da política do país.

Nos anos 1990, já era advogado da Exit, uma associação criada na década anterior para orientar pessoas sobre suicídio assistido. Apesar de previsto no Código Penal suíço desde 1942, a prática só decolou a partir de um esclarecimento proferido pela Justiça.

Em 1998, Minelli se separou do grupo e fundou a Dignitas por, segundo seu escritório, não concordar com a falta de uma política de prevenção geral sobre suicídio. Outra versão diz que o advogado considerava as regras da Exit muito restritivas.

A Dignitas acabou ganhando reconhecimento internacional por aceitar a associação de estrangeiros, mas também recebeu críticas por alegada falta de transparência financeira e supostamente mercantilizar a prática. Minelli foi processado diversas vezes, mas prevaleceu em quase todas na Suprema Corte da Suíça.

Na nota de falecimento, a associação lembra que a Dignitas propôs e ganhou uma causa histórica na Corte Europeia de Direitos Humanos, em 2011: um cidadão com capacidade de julgamento tem o direito de decidir o modo e o momento de tirar a própria vida.

Em 2020, outros dois processos patrocinados em algum grau por Minelli, na Alemanha e na Áustria, derrubaram legislações que impediriam a prática. A Áustria acabaria legalizando o suicídio assistido dois anos mais tarde.

Há alguns meses, França e Reino Unido avançaram legislações semelhantes. Em outubro, o Uruguai se tornou o primeiro país da América Latina a aprovar a eutanásia em forma de lei. O tema patina no Brasil. Recentemente, artistas, juristas, pesquisadores e profissionais de saúde criaram o grupo Eu Decido para estimular a discussão da questão no país.

Na Suíça, a Dignitas informou que o trabalho da entidade continuará normalmente. O advogado “já havia ampliado o conselho da associação há alguns anos, planejando a sucessão para uma transição tranquila e continuidade operacional.”

O serviço promovido pela Dignitas “é a segunda melhor maneira de morrer”. “O jardim é a melhor”, disse Minelli, ao Financial Times, ao brincar com a lembrança da avó.

Restou-lhe a opção que criou.

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