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Projetos artísticos ajudam a preservar oceano no Sul – 28/11/2025 – Ambiente

A COP30, conferência da ONU sobre o clima, em Belém (PA), foi o destino final do casal Diulie Tavares e Rafael Langella, que percorreu 18 mil km do litoral brasileiro na expedição itinerante Somos do Mar. Ao lado de voluntários do sul do Brasil, eles protagonizam projetos que envolvem arte, ciência e conservação oceânica.

A ideia é reunir soluções inspiradoras para a Década do Oceano, uma proposta das Nações Unidas para preservação marítima, com foco em ações coletivas contra a poluição ambiental.

O projeto Somos do Mar seguiu do Rio Grande do Sul ao Ceará a bordo de um motorhome, com o qual o oceanógrafo Langella e a engenheira ambiental Diulie levaram arte oceânica, desde 2019, para praças e escolas.

Nesse período, foram 45 mil espectadores, 170 ações e 63 municípios. O espetáculo “Mar de Soluções” e as oficinas de cultura oceânica foram apresentados para crianças e adultos.

Além disso, foram feitos cursos online para professores e lançados livros infantojuvenis sobre os problemas do lixo no mar e das mudanças climáticas.

“Nosso trabalho é uma gota no oceano, mas às vezes tudo o que precisamos é uma gota para transbordar e mudar hábitos”, diz Diulie, relembrando famílias que relataram mudança de hábitos após assistir ao espetáculo. “Passaram a separar o lixo e a olhar o oceano com outros olhos. Tornaram-se multiplicadores, mostrando o impacto das narrativas que levamos.”

A arte, pontua Diulie, permite falar de assuntos complexos de forma leve e com sentimento. “Fica mais fácil tocar as pessoas e promover mudanças, levar possibilidades e motivação para cada um fazer sua parte.”

Depois da COP30, o casal está retornando para Santa Catarina, de onde planeja uma nova expedição, desta vez pela costa da América Latina.

Também em Santa Catarina nasceu o Tartaruga-de-Mamão, projeto de extensão universitária inspirado no folclore catarinense do boi-de-mamão (semelhante ao boi-bumbá), no qual o boi dá lugar à tartaruga.

Criado em 2017, ele envolve 60 pessoas do Campus Itajaí do Ifsc (Instituto Federal de Santa Catarina), dos grupos Tarrafa Elétrica e Pequeninus e da comunidade local. Escolas e espaços públicos são palco da peça musical, que mescla arte e cultura popular afro-brasileira para contar a história de uma tartaruga prejudicada pelo lixo no mar.

Foram 80 apresentações em 18 cidades, além da produção de videoaulas, videoclipes, oficinas de arte e materiais pedagógicos digitais. O trabalho não parou nem na pandemia, com interações online com crianças.

“Fortalecemos também a autoestima e o senso de comunidade nos participantes”, explica o idealizador, Rodrigo Cavaleri, oceanógrafo e professor do Ifsc. “Tudo é executado de forma coletiva, com oficinas participativas.”

Agora, o grupo cria novos instrumentos musicais e personagens para a próxima peça. “Também são abordados temas como a sobrepesca, a proteção dos oceanos e o consumo responsável”, reforça a coordenadora do trabalho, Rose Fernandes, do Ifsc. “Trabalhamos educação ambiental e as relações étnico-raciais por meio da ciência, arte e cultura oceânica”, resume.

Já no Paraná, o projeto Coalizão foi endossado pela Unesco (braço da ONU para educação, ciência e cultura) como uma das iniciativas da Década do Oceano. Ele envolve cientistas da UFPR (Universidade Federal do Paraná), IFPR (Instituto Federal do Paraná) e Unespar (Universidade Estadual do Paraná) que construíram uma rede colaborativa.

“Falamos de ciência e arte, trabalhando juntos para chegar a diferentes atores da sociedade”, conta Camila Domit, doutora em biodiversidade marinha e coordenadora do Laboratório de Ecologia e Conservação da UFPR.

O grupo já criou dois documentários com foco na biodiversidade marinha e valorização da população caiçara do Paraná. Um deles é o “Trecho Seis”, curta-metragem que mostra o resgate e a recuperação de pinguins encontrados no litoral do estado.

Eles também organizam murais, exposições, apresentações em escolas e eventos em várias cidades. “Queremos banhar a sociedade com oceano, ciência e arte, trazendo de forma lúdica os desafios da Década do Oceano, como a valorização da cultura oceânica”, ressalta Camila.

Também no litoral paranaense, outro projeto destaca a preservação do oceano e a chamada economia do mar. Ele acontece em Antonina (PR), na Copescarte (Cooperativa das Trabalhadoras Autônomas da Pesca e Acessórios Artesanais). Foi lá que Andreia Rodrigues Cabral se encantou com a possibilidade de fazer criações com couro e escamas de peixes, conchas e outros componentes marinhos, que viram produtos que impulsionam o desenvolvimento de mulheres.

“Eu era muito tímida e a vivência com elas fez eu me comunicar melhor, voltei a estudar e hoje sou técnica em meio ambiente. Mas muitas mulheres vivem apenas desta renda”, conta Andreia, que participará da próxima exposição de telas criadas com couro de peixes, retratando pássaros regionais.

Como ela, outras 42 já passaram pelo projeto desde sua criação, em 2006. A história virou livro, escrito pela bióloga e coordenadora do projeto, Leocília da Silva. “Eram mulheres marisqueiras, com pouco estudo, que encontram aqui qualificação profissional, valorização pessoal, desenvolvimento social e ambientalmente sustentável”, diz.

O trabalho começa com o beneficiamento da pele de peixe, que vira couro e depois itens como calçados, roupas, biojoias, cintos, pulseiras e quadros. A cooperativa já exportou para Coreia do Sul e Itália e expõe em feiras por todo Brasil.

Conexão Humana

A relação do brasileiro com o mar foi tema de pesquisa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, em parceria com a Unesco e com a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Ela mostra que apenas 30% dos entrevistados entendem que suas ações causam impacto direto no oceano, enquanto 23% dizem acreditar que os impactos são apenas indiretos. Já 44% contam achar que suas ações não impactam no oceano.

O estudo também revela que, apesar de 87% afirmarem estar dispostos a mudar hábitos pelo oceano, apenas 7% participaram de atividade de conservação marinha nos últimos 12 meses.

A oceanógrafa Liziane Alberti, especialista em conservação da biodiversidade da Fundação Grupo Boticário, avalia que trabalhos envolvendo arte, ciência, cultura oceânica e conscientização ambiental alcançam a “conexão humana e emocional”, necessária para ação. Para ela, essas ações colaboram para a Década do Oceano, promovendo a transformação social e a valorização do mar, 1 dos 7 resultados esperados nesta década

“Elas despertam a empatia, sentimento fundamental para a sociedade sentir-se parte do problema e da solução. Elas criam caminhos para o engajamento, mostrando para as pessoas como elas podem agir, criando um efeito multiplicador.”

Esta reportagem foi premiada no edital Conexão Oceano de Comunicação Ambiental, promovido pela Fundação Grupo Boticário, em parceria com a Unesco.

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