quinta-feira, novembro 27, 2025

Psicodélicos: ibogaína e 5-MeO-DMT para veterano de guerra – 27/11/2025 – Virada Psicodélica

Está em cartaz na Netflix mais um filme sobre a promessa terapêutica de psicodélicos –no caso, ibogaína e 5-MeO-DMT. Vale a pena assistir ao documentário “No Mar e na Guerra”, até para refletir sobre o custo humano do belicismo dos EUA, que ora tem a Venezuela na alça de mira, e o potencial clínico dessas substâncias alteradoras da consciência para a saúde mental.

O filme traz uma estatística chocante: o almirante Brian Losey aparece na tela (e no trailer da Netflix) para citar que em duas décadas, do 11 de setembro de 2001 até 2021, morreram por suicídio quatro vezes mais veteranos das guerras do Afeganistão e do Iraque do que os vitimados em combate. Foram 30.177 contra 7.057, respectivamente.

A fita apresenta traumas e agruras de fuzileiros navais (Navy Seals), vários com ideações suicidas. Empurrado pela esposa, o protagonista Marcus Capone vai à clínica Ambio no México para se tratar com ibogaína, substância obtida da planta africana Tabernanthe iboga, e com 5-MeO-DMT, na forma inalada conhecida como “bufo” (da secreção do sapo Incilius alvarius, antes chamado Bufo alvarius).

A ibogaína tem sido mais usada, em caráter excepcional, contra transtorno de uso de substâncias. O médico Bruno Rasmussen Chaves, por exemplo, já tratou milhares de pacientes em Ourinhos (SP) com autorizações especiais da Anvisa.

Capone melhora e se torna apóstolo do tratamento para ex-combatentes com transtorno de estresse pós-traumático. O documentário entrevista veteranos antes, durante e depois da terapia, o que resulta em cenas de soldados brutamontes de elite a desmoronar diante da câmera para falar de traumas de infância e de guerra.

O filme também mostra um ensaio com ibogaína e veteranos na Universidade Stanford. Nolan Williams, renomado estudioso que desenvolveu a técnica de estimulação cerebral para depressão, publicou em janeiro de 2024 artigo relatando taxas de remissão acima de 80% em 30 voluntários, sustentadas um mês após a dose única (Williams, ele próprio com grave depressão, morreu em outubro passado por suicídio).

O grupo de Stanford também associou a ibogaína com outra substância, mas não um psicodélico como a 5-MeO-DMT usada na clínica mexicana. Empregou-se no estudo o magnésio, só com o objetivo de diminuir o conhecido risco de arritmia cardíaca no uso de ibogaína, que em raros casos pode levar à morte do paciente.

O documentário passa ao largo dessa distinção importante entre o tratamento a que veteranos recorrem no México (que é ilegal nos EUA) e o ensaio de Stanford. No entanto, a entrevista com Williams, justaposta às experiências transformadoras de ex-combatentes na Ambio, parece conferir certa legitimação acadêmica para o protocolo com ibogaína seguida de 5-MeO-DMT.

“Falta evidência científica de ensaios clínicos e não é baseado em nenhuma tradicão indígena”, ressalva a antropóloga Bia Labate, do Instituto Chacruna em São Francisco (EUA). “É uma criação recente, o que passa despercebido no filme e, de modo geral, no campo.”

Bruno Ramos Gomes, psicólogo que acompanha pacientes do xará Rasmussen Chaves no Brasil, recomenda não usar nenhum outro psicodélico nas semanas após tratar-se com ibogaína. Ele vê dois motivos para essa precaução:

“Primeiro, porque a ibogaína tem uma curva de efeito muito longa”, explica. “Acreditamos ser importante dar esse tempo para o paciente perceber os efeitos tardios, e só então, se fizer sentido, podem continuar seu processo com outros psicodélicos.”

“A outra razão é que muitos pacientes que tratamos têm pouca ou nenhuma experiência com psicodélicos, e enfrentar duas dessas intensas e profundas experiências perto uma da outra não é necessariamente construtivo”, complementa. Ele acha que a secreção do sapo entra para garantir uma experiência de maravilhamento que muitas vezes a ibogaína não traz, pois ocasiona um estado mais onírico que psicodélico (há quem prefira chamá-la de “onirogênico”).

Substâncias psicodélicas têm aparecido com alguma frequência em séries e filmes de plataformas –pense em “Nove Desconhecidos” (duas temporadas na Amazon Prime). Nem sempre de maneira positiva, como se viu em “Wormwood” e, mais recentemente, em “Desobedientes”.

O assunto tem apelo audiovisual, está claro, mas os serviços de streaming ainda não se decidiram se isso é bom ou ruim.


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